quarta-feira, abril 25, 2007

Grândola


Grândola, vila morena
Terra da fraternidade
O povo é quem mais ordena
Dentro de ti, ó cidade

Dentro de ti, ó cidade
O povo é quem mais ordena
Terra da fraternidade
Grândola, vila morena

Em cada esquina um amigo
Em cada rosto igualdade
Grândola, vila morena
Terra da fraternidade

Terra da fraternidade
Grândola, vila morena
Em cada rosto igualdade
O povo é quem mais ordena

À sombra duma azinheira
Que já não sabia a idade
Jurei ter por companheira
Grândola a tua vontade


Zeca Afonso

sábado, abril 14, 2007

Origem dos sonhos Esquecidos


Tudo vai bem, amor! Aqui estamos longe!
Aqui malogra-se a abordagem dos terrores,
ninguém descarna o sonho ou a esperança,
não há fantasmas de espingarda ao ombro,
ninguém agoniza chicoteado pelas sombras...
Aqui não há ditadores nem guilhotinam os oráculos,
ninguém encobre estrelas com areia,
não cortam com navalhas os seios das mulheres,
nem se incendeiam ghetos com corpos de crianças:
é tudo útil, simples, como um campo de trigo
- a Esfinge é um animal de pedra muito gasta.
Os poetas podem passear nas ruas; a paz
não é uma aranha sobre a terra árida.
O sono não se povoa de estátuas de ameaça,
o amor não se faz de coração crispado:
o leito do amor é a simples terra nua.


Egito Gonçalves

Imagem de: Pedro Gonio

quinta-feira, abril 12, 2007

Sou assim


Transcendente (que transcende). (?)

Sobre humano (além do humano). (?)

Oh feliz de quem entende,

de quem busca e surpreende

os pontos, a recta e o plano!

Um pobre homenzinho ignaro,

com os pés colados ao mundo,

olha o alto e olha o fundo,

consegue ver tudo claro.

Deus te abençoe, meu amigo.

Deus te dê o que desejas.

Que palpes, que oiças, que vejas

o sonho que anda contigo.

Todo claro é escuro em mim.

Não tenho asas nem rabo.

Não SOU Anjo nem Diabo.

Sou ASSIM.


António Gedeão


Imagem de: Glover Barreto

sexta-feira, abril 06, 2007

Que vergonha rapazes


Que vergonha rapazes!Nós pràqui,
caídos na cerveja e no uísque,
a enrolar a conversa no «diz que»
e a desnalgar a fêmea («Vist'? Vi!»)

Que miséria, meus filhos! Tão sem jeito
é esta videirunha à portuguesa,
que às vezes me soergo no meu leito
e vejo entrar a quarta invasão francesa.

Desejo recalcado, com certeza...
Mas logo desço à rua, encontro o Roque
(«O Roque abre-lhe a porta, nunca toque!»)
e desabafo: - Ó Roque, com franqueza:

Você nunca quis ver outros países?
- Bem queria, Sr O'Neill! E...as varizes?


Alexandre O'Neill

segunda-feira, abril 02, 2007

As Lágrimas do Poeta


Um poeta barroco disse:
as palavras são
as línguas dos olhos

Mas o que é um poema
senão
um telescópio do desejo
fixado pela língua?

O voo sinuoso das aves
as altas ondas do mar
a calmaria do vento:
Tudo
tudo cabe dentro das palavras
e o poeta que vê
chora lágrimas de tinta.

Ana Hatherly

Imagem de: Fernando Figueiredo